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Cuiaba - MT / 15 de agosto de 2025 - 16:27

O desafio de controlar com regulação o oligopólio do saneamento

Na última terça-feira (5), a Aegea consolidou seu domínio exclusivo sobre o saneamento paraense ao vencer a licitação do Bloco C. Com isso, a empresa se tornou a única concessionária responsável pelos serviços de água e esgoto em todo o estado do Pará pelos próximos 40 anos, após já ter conquistado os Blocos A, B e D em abril.

Esse monopólio regional não é exceção, mas, sim, reflexo de uma tendência nacional que se desenha desde 2020, quando o setor foi aberto à iniciativa privada. Cinco anos depois, o cenário revela uma concentração impressionante: levantamento de final de 2024 indica que apenas quatro empresas controlam 84% dos serviços privados de saneamento no Brasil.

A Aegea lidera esse ranking, detendo sozinha metade do mercado privado nacional. Na segunda posição está a Equatorial, que ganhou relevância após vencer o leilão da Sabesp. Completam o grupo a Iguá, recente vencedora do leilão de Sergipe, e a BRK, com operações espalhadas por diversos estados.

Essa concentração resulta, em grande parte, das escolhas de modelagem econômico-financeira, que priorizaram a maior valor de outorga como critério de seleção. Em vez de estimular a competição técnica por melhores propostas, esse formato acabou favorecendo significativamente a formação do oligopólio no saneamento que temos hoje.

A concentração do setor traz potenciais benefícios, pois empresas operando em grandes territórios podem alcançar economias de escala, reduzindo custos e melhorando a qualidade dos serviços. Além disso, a inovação em áreas extensas pode gerar ganhos significativos de eficiência.

Contudo, os riscos são evidentes. Em mercados oligopolizados, a falta de competição permite a fixação de preços mais altos, onerando as tarifas dos consumidores. Há também o risco de seleção adversa de investimentos, priorizando regiões mais lucrativas e ampliando desequilíbrios no acesso ao saneamento. Essa realidade já se manifesta na exclusão das áreas rurais da maioria dos projetos licitados.

Em teoria, esses problemas deveriam ser mitigados pela regulação, já que o setor opera sob contratos administrativos que estabelecem metas e matriz de risco, além da fiscalização por agências reguladoras, apoiadas por verificadores independentes.

Na prática, porém, a experiência brasileira não demonstra eficácia regulatória. As agências não têm conseguido exercer controle robusto e nem aplicar multas contratuais quando as empresas performam abaixo das metas estabelecidas contratualmente. Os próprios verificadores “independentes” enfrentam conflitos de interesse tanto na sua escolha quanto nos mecanismos de pagamento pelos serviços prestados.

Nesse contexto, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) emerge como peça fundamental. A transição de um modelo de prestação pública para um oligopólio privado exige atenção especial do órgão antitruste para prevenir e punir formação de cartéis, elevação artificial de tarifas e abuso de poder econômico.

Os atuais mecanismos de financiamento do setor criam interesses econômicos entrelaçados entre as poucas grandes empresas de saneamento atuando no Brasil, especialmente considerando a possibilidade de fusões ou participações cruzadas em fundos de investimento. Esse cenário aumenta o risco de descumprimento das metas de eficiência e de cobertura definidas pela Lei do Saneamento.

A universalização do saneamento apresenta desafios distintos conforme a região, exigindo investimentos e planejamento adaptados às necessidades locais. Com a escolha feita pelo modelo oligopolizado, cabe às agências reguladoras, seguindo as normas de referência da ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico), controlar as tarifas para mantê-las acessíveis, especialmente para grupos vulneráveis. Simultaneamente, o Cade deve exercer vigilância constante para prevenir práticas anticompetitivas em um setor estratégico para o desenvolvimento nacional e para a qualidade de vida da população brasileira.

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Cuiaba - MT / 15 de agosto de 2025 - 16:27

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