No dia 6 de junho de 2005, vinha à tona um dos maiores casos de corrupção da política brasileira e o primeiro a abalar a cúpula petista (Petrolão e INSS vieram depois). O mensalão, como ficou conhecida a prática recorrente da compra de apoio político para aprovar projetos do governo Lula, levou vários membros importantes do PT à prisão. Vinte anos depois, dos 38 réus, 24 foram condenados. Nenhum permanece preso.
O esquema foi delatado por Roberto Jefferson, ex-deputado federal do PTB, e derrubou nomes fortes do PT, como José Genoino, ex-presidente do partido, assim como intermediários que faziam a operação financeira entre os deputados e o governo.
Ninguém cumpriu pena completa. Depois de pouco tempo na cadeia, as defesas dos implicados no esquema conseguiram afrouxar as condenações para prisão domiciliar e 17 condenados tiveram suas penas extintas pelos indultos de Natal concedidos pelos ex-presidentes Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB).
Entre eles estão o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, Roberto Jefferson e o atual presidente do partido de Bolsonaro, Valdemar Costa Neto (PL). O benefício consiste no “perdão” ao detento, sem a necessidade de cumprir o restante da punição.
O processo do mensalão durou oito anos e foi julgado no Supremo Tribunal Federal (STF), tendo o ministro (hoje, aposentado) Joaquim Barbosa como relator. Anos depois, foi o STF também quem anulou sentenças com base nos indultos.
Algumas figuras, mesmo com “perdoadas” pelo mensalão, voltaram a aparecer em outros esquemas da turma. Caso do então ministro da Casa Civil José Dirceu, investigado da Operação Lava Jato, que apurou o desvio bilionário de recursos da Petrobras. Com as penas do mensalão e Petrolão anuladas, se prepara para voltar à vida pública em 2026.
Veja como estão as figuras centrais de um dos maiores esquemas de corrupção do país:
José Dirceu: acusado de ser um dos mentores
Ex-ministro da Casa Civil do primeiro governo de Lula, José Dirceu foi apontado como um dos mentores do Mensalão. Em 2005, teve o mandato cassado e, em 2013, foi condenado a sete anos e 11 meses pelo crime de corrupção ativa.
Cumpriu apenas um ano em regime fechado e outro ano em casa. Foi beneficiado pelo indulto natalino concedido pela então presidente Dilma Rousseff e teve sua pena anulada pelo atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso.
Dirceu também foi condenado por envolvimento no Petrolão, esquema de desvios bilionários da Petrobras. No total, as penas somavam mais de 30 anos. Mas, em outubro de 2024, o ministro do STF Gilmar Mendes anulou todos os atos processuais da Lava Jato contra ele.
Dirceu durante todo este tempo sempre foi figura relevante dentro do partido, uma espécie de conselheiro. E agora que se tornou “ficha limpa”, com as decisões favoráveis, cogita disputar uma vaga na Câmara dos Deputados em 2026, com apoio de Lula.
Roberto Jefferson: o delator
Roberto Jefferson foi condenado a sete anos de prisão e multa por lavagem de dinheiro e corrupção no mensalão. Preso em 2014, já em 2015 conseguiu o regime aberto e no mesmo ano foi um dos beneficiados pelo indulto natalino da presidente da época Dilma Rousseff.
Em 2022, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, o condenou à prisão preventiva por nove anos por “incitar a prática de crimes e atentar contra o exercício dos Poderes e pelos crimes de calúnia e homofobia” em suas postagens nas redes sociais. A decisão foi revogada depois que ele publicou um vídeo com ofensas à ministra do STF Carmen Lúcia. Quando os agentes da Polícia Federal foram até sua casa para levá-lo à prisão, Jefferson os recebeu com tiros de fuzil e granadas. Dois ficaram feridos.
Na época, ele foi levado à penitenciária de Bangu, no Rio de Janeiro, mas logo em seguida, em 2023, foi encaminhado para um hospital por problemas de saúde, onde permaneceu até então. No mês passado, Moraes voltou a conceder a prisão domiciliar devido ao quadro clínico do parlamentar e à sua idade, 71 anos.

Delúbio Soares: o operador que fazia os empréstimos
Ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares foi acusado de ser a pessoa que operacionalizava todo o esquema de compra de apoio político do mensalão. Peça central, segundo o processo, era incumbido de formular as simulações de empréstimos para assegurar o fluxo de dinheiro.
Da condenação de oito anos de prisão por crimes de formação de quadrilha e corrupção ativa apenas dois anos e três meses foram cumpridos em regime fechado e uma parte em regime aberto. Com base no indulto de Natal da ex-presidente Dilma, o ministro Luís Roberto Barroso, do STF, concedeu perdão da pena do processo do mensalão, e ele ficou livre.
O petista também esteve envolvido na Operação Lava Jato. O desfecho foi o mesmo. Após ser preso sob a acusação de lavagem de dinheiro para financiar campanhas eleitorais de políticos do PT e do PDT, teve a condenação anulada pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Ribeiro Dantas, que enviou o caso para ser reiniciado na Justiça Eleitoral.
José Genoíno: interlocutor político
O ex-presidente do PT José Genoino foi condenado a dois anos e três meses por formação de quadrilha e a quatro anos e oito meses por corrupção ativa. Segundo o relator do processo do mensalão no STF, o então ministro Joaquim Barbosa, Genoino “valeu-se da influência da sua posição para ser interlocutor político do grupo criminoso”, formulando as propostas aos líderes dos partidos que faziam parte da base aliada do governo federal à época.
Genoino foi um dos primeiros condenados no processo do mensalão a receber o indulto da pena. O ex-deputado cumpriu um ano e dois meses na Penitenciária da Papuda, em Brasília, e alguns meses em casa. Em 2014, o STF extinguiu a pena com base no benefício.
Marcos Valério: o operador que pagava
Marcos Valério recebeu a maior pena. Foi condenado a quase 38 anos de prisão pelos crimes de peculato, corrupção ativa, lavagem de dinheiro e crime contra o sistema financeiro. O publicitário era o operador financeiro que fazia os repasses irregulares. Depois de cumprir seis anos de regime fechado, o ministro Barroso autorizou que a pena progredisse para o semiaberto.
Durante a pandemia, Valério foi para prisão domiciliar por ser considerado alguém do grupo de risco. Ele continua cumprindo a pena assim. Segundo decisão judicial do ministro Barroso, porque “não há, em Nova Lima (MG), estabelecimento prisional adequado para o cumprimento do regime”.

Valdemar Costa Neto: o articulador
Assim como os demais, o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto foi condenado, preso por um período bem inferior ao da pena e ficou livre após o indulto de Natal e liberação do STF.
Preso em 2013 sob a sentença de sete anos e dez meses de detenção, foi para prisão domiciliar após cumprir cerca de um ano cerca de um ano na penitenciária da Papuda, em Brasília, e seguiu para prisão domiciliar.
Costa Neto renunciou na época a seu cargo de deputado federal. O parlamentar, acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, era figura central no esquema de compra de apoio da base aliada para a aprovação de projetos do governo Lula.