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Cuiaba - MT / 3 de julho de 2025 - 21:41

Exército e Aeronáutica expandem efetivo temporário em meio a pressão sobre custos

Em meio ao cenário de crescentes limitações orçamentárias, Exército e Aeronáutica expandiram em 29% o contingente de oficiais temporários entre 2014 e 2023. A contratação de pessoas sem vínculo definitivo representa uma opção de menor custo para os cofres públicos e tem avançado, apesar da defesa interna por quadros permanentes.

A tendência foi impulsionada sobretudo pela FAB (Força Aérea Brasileira), que registrou um incremento de 42% no período. Em 2023, pela primeira vez em ao menos uma década, oficiais temporários passaram a ocupar o posto de major na corporação. No Exército, o crescimento foi de 22%.

A presença de militares sem vínculo permanente também se tornou mais significativa no efetivo total das Forças. No ano passado, mais da metade do efetivo total da FAB era temporário, o maior patamar em pelo menos dez anos. No Exército, os temporários formavam 71% da Força em 2014, percentual que subiu para quase 76% em 2023.

Os dados foram obtidos via LAI (Lei de Acesso à Informação). O Exército não disponibilizou informações sobre oficiais referentes ao ano passado.

A FAB afirma, em nota, que a presença de temporários permite aumentar o efetivo e reduzir custos com pagamento de inativos e pensionistas. Segundo a Força, a convocação de oficiais sem vínculo permanente não compromete a qualidade dos serviços.

Em nota, o Exército afirma que a redução gradual do efetivo permite otimizar custos da Força. A instituição diz ainda manter compromisso com capacitação dos militares temporários, que são aptos a cumprir missões.

Temporários podem chegar a escalões mais altos ao ingressarem por processos seletivos exclusivos para quem tem ensino superior, em vagas como médico e professor. São processos mais simples, que incluem avaliação de currículo, saúde e aptidão física. Eles podem permanecer nas Forças Armadas por até oito anos.

Em nota, o Exército afirma que o aumento de temporários visa otimizar os gastos da Força e que esses militares estão aptos a cumprir as missões da instituição.

A principal diferença entre oficiais de carreira e temporários é a aposentadoria, já que militares sem vínculo permanente não podem entrar na reserva remunerada. Em vez disso, eles ganham uma compensação pecuniária por ano de serviço prestado, no valor do salário mensal que recebiam enquanto estava na ativa.

Outro ponto é que esses oficiais só podem permanecer nas Forças até os 45 anos, quando devem ser desligados. Além disso, eles têm um limite para subir de posto.

Por outro lado, podem ter direito a alguns dos benefícios dados aos militares de carreira. Isso inclui, por exemplo, uso do sistema de saúde das Forças Armadas e acesso a hotéis de trânsito.

Além da diminuição de gastos com previdência, também há uma redução de custos com a formação desses oficiais, segundo Karina Furtado, coordenadora do Laboratório de Governança, Gestão e Políticas Públicas em Defesa Nacional.

Isso porque os temporários, sobretudo os que vão ocupar cargos de mais autoridade, costumam ter experiência profissional, que é avaliada no processo seletivo. Eles também podem ter formação acadêmica avançada, com pós-graduação.

Apesar da vantagem na redução de gastos, o aumento de temporários pode ser um desafio no preparo de militares, de acordo com Karina. Isso ocorre sobretudo na FAB (Força Aérea Brasileira), que lida com tecnologias mais complexas, que exigem experiência de longo prazo.

“A complexidade requer quadros profissionais permanentes, treinados por décadas para operar tecnologias. Ter uma rotatividade constante, mesmo que oito anos seja um período relativamente longo, não é compatível com as necessidades operacionais dessas tecnologias da Força Aérea”, afirma.

O mesmo vale para a Marinha, segundo Furtado. Essa é a única Força Armada que ainda não adota os contratos temporários em larga escala. Hoje, a categoria representa cerca de 23% do efetivo total da Força.

A Marinha afirma, em nota, que adotou medidas para reduzir os efetivos e, com isso, gastos com salários e pensões. Houve uma redução nos postos para militares de carreira, segundo a Força, mas o percentual de militares temporários se manteve constante.

O aumento de oficiais sem vínculo permanente é um sintoma do excesso de serviços militarizados, sobretudo dos que são exclusivos para membros das Forças Armadas, de acordo com Adriana Marques, professora do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Ela diz que boa parte desses servidores temporários é usada para suprir a demanda de instituições que servem apenas aos militares, como hospitais e instituições de ensino.

Por isso, segundo a professora, substituir os profissionais de carreira não é suficiente para promover um ajuste fiscal nas contas das Forças Armadas. Como consequência, o quadro pode prejudicar a alocação de recursos à segurança e à defesa do país.

Em 2024, as Forças Armadas investiram R$ 9,2 bilhões da Defesa em equipamentos e programas, como mostrou levantamento da Folha em fevereiro deste ano. O valor foi usado principalmente para a compra de equipamentos, mas também para controle aéreo e para o programa Calha Norte, em áreas fronteiriças. A cifra representa 7,5% dos gastos militares e está abaixo dos 20% considerados ideais pela Otan, a aliança militar do Ocidente.

“Se os privilégios militares não existissem, esses servidores temporários não precisariam ser contratados”, afirma Adriana. “Eles são um sintoma de que o sistema não funciona como deveria. Temos uma situação geopolítica instável, vimos mais guerras do que nas últimas décadas. Então, precisamos de um setor de defesa preparado.”

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Cuiaba - MT / 3 de julho de 2025 - 21:41

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