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Cuiaba - MT / 28 de julho de 2025 - 9:43

Ex-secretário de Lula: quem é o professor que pediu guilhotina para família Justus  

Apesar de ter sido professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e de ser autor de livros e artigos acadêmicos, Marcos Dantas Loureiro nunca teve tanta visibilidade quanto agora. A fama, no entanto, não veio por bons motivos.

Ele fez um comentário repugnante sobre a família do empresário Roberto Justus no último fim de semana. 

Uma foto em que a filha mais nova de Justus, de 5 anos, aparece segurando uma bolsa de grife motivou o comentário de Dantas. 

Com bandeiras vermelhas e da Palestina ao lado do seu nome no perfil, ele comentou: “Só guilhotina…”. Dantas respondia a um outro usuário do X que via na foto dos Justus um sinal de que “os bolcheviques estavam certos”.

Os bolcheviques, a ala mais radical dos comunistas russos que derrubaram o regime em 1917, promoveram assassinatos em série de famílias inteiras — sem poupar crianças

Como é praxe nesses casos, ele apagou a publicação e divulgou um pedido de desculpas (veja ao fim da reportagem). Mas família Justus anunciou que vai processar os autores de comentários do tipo (Dantas não foi o único).

a UFRJ se apressou em divulgar uma nota afirmando que o professor se aposentou em 2022 e que as opiniões dele não representam a instituição. “A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Escola de Comunicação da UFRJ (ECO) repudiam qualquer tipo de expressão de pensamento que incite à violência ou agrida a terceiros”, diz a nota, publicada nesta segunda (7).

Quem é Marcos Dantas, que atacou Justus? 

Marcos Dantas tem graduação em Comunicação e doutorado em Engenharia de Produção, ambas pela UFRJ. 

A plataforma Google Scholar contabiliza 1.376 citações a artigos e livros de Dantas — um número respeitável. As três obras mais citadas de autoria dele têm a palavra “capital” ou “capitalismo” no título. 

E é fácil entender por quê: Dantas enxerga o mundo pelas lentes de Karl Marx. “Sem dúvida nenhuma o grande pensador da economia política foi Karl Marx”, ele disse, em uma palestra virtual cinco anos atrás. 

O especialista aplica a lógica marxista à de comunicação. Uma de suas frases favoritas é a de que os dados são “o petróleo do século XXI”. 

O segundo item mais citado de Dantas, um artigo publicado em 2003, utiliza os conceitos marxistas da “teoria do valor” e da “mais-valia”.

No artigo, que tem o título de “Informação e trabalho no capitalismo contemporâneo”, o professor argumenta que o agente da revolução socialista seria não a classe operária, mas pessoas como o próprio Marcos Dantas: “Hoje em dia, precisamos reconhecer que os agentes da transformação são todos aqueles que, trabalhando com o conhecimento obtido do processamento técnico-científico da informação, põem em questão, um tanto conscientemente, um tanto espontaneamente, os arranjos capitalistas de apropriação privada dessa nova e extraordinária forma de riqueza”.

Em seus últimos anos na UFRJ, Dantas foi coordenador de um certo Grupo Marxiano de Pesquisa em Informação, Comunicação e Cultura. 

Regulação dos meios 

Dantas não é um acadêmico excêntrico que fala apenas aos grupos radicais de esquerda.

Em seu site, ele afirma que foi Secretário de Educação a Distância do Ministério da Educação e Secretário de Planejamento do Ministério das Comunicações — ambos no primeiro mandato de Lula, duas décadas atrás.

Uma década atrás, Marcos Dantas estava focado em uma batalha: a luta contra as grandes empresas de radiodifusão e a favor da regulação dos meios de comunicação (sobretudo, a TV). Mas, nos últimos anos, ele se voltou para a internet.

Entre 2015 e 2023, ele foi membro do Comitê Gestor da Internet (CGI), um órgão criado em 1995 com uma função autoexplicativa. Ele era um representante da “Comunidade Científica e Tecnológica”, e chegou ao cargo eleito por seus pares.

Nas reuniões do colegiado, Dantas insistia na necessidade de uma agência regulatória para supervisionar a internet brasileira e evitar a influência do “capital financeiro”. 

Atas mostram atuação de Dantas para regular a internet 

As discussões do CGI, que se reúne mensalmente, ficam registradas em atas. Por meio delas, é possível entender o que defende Marcos Dantas. 
 
Em fevereiro de 2022, o documento mostra Dantas pedindo que o CGI adotasse uma postura mais ativa no debate sobre o Projeto de Lei (PL) 2630/2020, que pretende regular a internet para combater as “fake news”. A ata da reunião afirma: “Dantas enfatizou que o CGI.br não deve ter medo de entrar nesses debates e que deve se preparar teoricamente e politicamente para isso”. 

A ata prossegue, citando Dantas em terceira pessoa: “A sua maior preocupação no momento, é identificar como essas plataformas podem contribuir e estão ou não contribuindo para fortalecer a democracia liberal e evitando a disseminação de ideias, pensamentos e projetos que são antidemocráticos e anticivilizatórios, como no caso recente da vacinação infantil de COVID-19 no Brasil, que foi impactada pela disseminação de mentiras”. 

Não há menção aos apologistas da guilhotina. 

Em uma variação da sua metáfora preferida, ele também comparou os dados ao minério e defendeu que o Estado regulasse as plataformas de internet. “Dados terão dimensão econômica, política e cultural similar à dos minérios nas sociedades anteriores. Disse que estamos entrando numa sociedade em que dados constituem a grande riqueza e, por conta disso, a sociedade tem que regular sua exploração e uso por meio do Estado”, afirmou. 

Gafe e pedido de desculpas 

Na mesma reunião, Dantas teve de explicar um erro que cometeu. Ele enviou a versão errada de um convite à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). 

O convite enviado por Dantas incluía uma menção a um acordo de cooperação entre a Secretaria de Governo Digital (SGD) e a Associação Brasileira de Bancos (ABBC). Mas A CGI havia decidido não incluir esse item para aumentar as chances de que a ANPD (ainda durante o governo Bolsonaro) recusasse o convite.  

Diz a ata: “Marcos Dantas esclareceu que era seu papel coordenar o processo de escrita e envio do convite, porém ele pegou Covid-19, o que causou atrasos. Na ocasião, ele não lembrou de ter eliminado aquele tópico e autorizou o envio, já que é coordenador do GT e o conteúdo é algo muito simples”. O documento prossegue, relatando as desculpas de Dantas: “Posteriormente, foi feita uma observação de que o convênio não deveria ter constado e foi imediatamente retratado”. 

Jargão marxista no CGI 

Na reunião do CGI de 30 de setembro de 2022, Dantas usou novamente um argumento derivado do marxismo: o de que os países pobres têm suas riquezas extraídas pelos mais ricos. “Quando se pensa em sul global, é uma situação em que a economia se baseia essencialmente na extração de dados. Então os nossos atos, ideias, corpos e comportamentos são o pré-sal do qual se extrai esses dados, cada pessoa fornece muita riqueza para grandes corporações norte-americanas”, ele afirmou. 

“Ao pensar na regulação no Brasil e em países do sul global, é importante pensar que essa riqueza tem que ser dividida com nossa sociedade, tem que servir para enriquecimento do nosso PIB, para o crescimento de empregos”, disse o professor. 

Dantas também já defendeu que o próprio CGI atuasse como órgão fiscalizador da propagação de fake news, proposta pelo Projeto de Lei (PL) 2630/2020. Na avaliação dele, o Comitê Gestor da Internet era “o locus ideal” para isso. 

“Nesse aspecto talvez o PL pudesse avançar no sentido em que o CGI.br teria que ser o provocador da entidade e caberia ao Comitê acompanhar se determinados códigos de conduta não são adequados e, no caso de não cumprimento, acionaria as entidades responsáveis, tais como Cade e Ministério Público”, ele propôs. 

O projeto de lei, que está parado desde 2023, dá poder ao Estado para coibir atos de “discurso de incitação à violência” na internet.

Coincidentemente, Dantas assina um artigo publicado pelo jornal O Globo nesta segunda. Ao que tudo indica, o texto foi escrito antes do caso Justus. No artigo, Dantas defende um “modelo regulatório” para as redes sociais que garanta “a convivência e os acordos civilizados de nossa sociedade” contra a “barbárie”.

Professor se defende

Publicação feita por Marcos Dantas em 2019: guilhotina sem metáfora.Publicação feita por Marcos Dantas em 2019: guilhotina sem metáfora. (Foto: Reprodução/X)

A Gazeta do Povo entrou em contato com Marcos Dantas, mas não obteve resposta.

Nesta segunda, ele publicou uma carta dirigida a Roberto Justus. “Era para ser, e continua sendo, uma simples metáfora, aliás volta e meia empregada por alguém no X”, inicia o professor aposentado.

“Nem de longe, em momento algum, passou pela minha cabeça fazer qualquer ameaça pessoal ao senhor, sua esposa ou sua filha”, diz o professor.

Apesar de pedir desculpas, Dantas incluiu na sua carta um trecho confuso em que parece justificar a sua publicação: “Lembrar aquelas tragédias históricas, pode servir (gostaria, mas nem sempre) de alerta quanto a situações que dão, infelizmente, nas mentes mais simplórias, explosões de raiva”.

Não é a primeira vez que Dantas defendeu a aplicação de uma pena violenta contra os mais ricos. Apenas no X, ele já publicou mensagens semelhantes pelo menos 25 vezes.

Em 2020, também em reação a uma publicação envolvendo Roberto Justus, Dantas disse que “adoraria ter emprego de operador de guilhotina”.

Em 2019, sobre Bolsonaro, ele disse que “Robespierre já teria mandado esse fdp pra guilhotina”.

Em 2022, reagindo a uma reportagem sobre “socialites católicas”, ele escreveu: “Eu não sei porque mas quando eu vejo essas coisas, eu só me lembro da guilhotina…”

Além disso, a desculpa da “metáfora” tem um problema: em 2019, ele havia publicado uma mensagem quase idêntica no Twitter, acrescida de uma explicação: “Só guilhotina. E não é metáfora”. Não é possível saber o contexto da publicação porque o post original ao qual Dantas reagia foi apagado.

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