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Cuiaba - MT / 25 de julho de 2025 - 20:45

Dois anos após publicidade com transexual, vendas da Bud Light continuam baixas

Em abril de 2023, a cerveja Bud Light resolveu contratar Dylan Mulvaney, influencer que se identifica como mulher transgênero, para uma ação de marketing. Mais de dois anos depois, os resultados da companhia seguem no vermelho. Uma somatória de erros contribuiu para este desfecho.

Segundo agências de monitoramento de tendências, a marca sentiu queda de 3% nas vendas no último feriado de 4 de julho (data mais importante dos EUA, pleno verão do Hemisfério Norte e referência no comércio da bebida) na comparação com o mesmo período de 2024.

Em parte, o resultado acompanha uma queda do consumo geral de cerveja no país: 55% das distribuidoras afirmaram ter vendido “menos” ou “muito menos” em 2025 do que no ano anterior, em um levantamento que ouviu 50 distribuidoras – ou um total de 230 mil lojas varejistas, que respondem por quase metade do mercado do país.

Mas o caso da Bud Light é diferente. Líder em vendas até a controvérsia, a marca nunca mais recuperou o topo da lista.

A Bud Light vinha de números que já eram baixos em 2024 e sentiu perdas consistentes nas vendas desde uma série de vídeos no Instagram em parceria com Dylan Mulvaney, um boicote convocado por seus antigos entusiastas e as reações desastradas da corporação após as reações.

A queda

A cerveja “leve” em carboidratos da Anheuser-Busch Inbev era a mais vendida dos EUA desde o início do século. Lançada nos anos 1980, de 2001 a 2023 reinou absoluta no topo entre as mais populares dos EUA.

Sua imagem, associada a churrascos, encontros e aos esportes, tinha uma estratégia voltada ao patrocínio de grandes eventos esportivos e forte identificação com um público majoritariamente masculino, conservador e que mora nos estados do Centro e do Sul daquele país, longe das tendências progressistas dos grandes centros urbanos.

Isso mudaria quando a Inbev promoveu, em julho de 2022, a executiva Alissa Heinerscheid a vice-presidente de marketing da Bud Light. Formada em Harvard, ela tinha ideias diferentes sobre como alcançar outro público.

Primeira mulher a ocupar um cargo semelhante na companhia, Alissa viu necessidade de “renovar” a marca, que considerava “decadente” e que, sem rejuvenescimento, não teria futuro. As declarações foram dadas em um podcast uma semana antes da campanha.

Para além da desconsideração com seu público, a aposta em um perfil mais jovem demonstrou desconhecimento do fato de que esta camada bebe cada vez menos. Apenas 20% ou menos dos americanos abaixo de 28 anos de idade declararam consumir álcool com regularidade, concluiu uma pesquisa de autodeclaração da agência Gallup.

Para o especialista em posicionamento de marcas Ale Tcholla, a cervejaria com isso como que se voltou contra sua própria comunidade. “Foi como se houvesse uma quebra de confiança, quase como uma traição de alguém próximo, um amigo ou parceiro”, explica.

Um caso parecido aconteceu no passado aqui no Brasil, quando o sambista Zeca Pagodinho, fortemente associado à marca da Brahma, acabou virando a casaca para a concorrente Nova Schin. Tudo acabou resolvido em um bem-humorado comercial no qual Pagodinho volta para os braços da Brahma.  

Para Nicolas Reig, sócio do grupo Invoice, o episódio da Bud Light mostrou que as decisões de marketing tomadas na elaboração desta estratégia tentaram surfar uma onda progressista e colocaram opinião e ideologia acima do público da marca.

“A necessidade em estar no topo e a pressão constante por desempenho podem justificar esse erro terrível de tentar seguir uma onda sem entender o perfil do cliente”, analisa.

A face da controvérsia

Dylan Mulvaney completava um ano de transição de gênero naquele início de 2023. O processo foi acompanhado com atenção por um público que, na época, somava 1,8 milhão de seguidores. A marca resolveu parabenizá-la pela conquista com uma lata personalizada com seu nome.

A tentativa de associação a uma personalidade da internet com números tão vistosos demonstrou uma tendência de profissionais de publicidade visarem métricas de sucesso nas redes sociais acima das vendas, explica a consultora e especialista em gerenciamento de crise Simone Ludwig.

“O alinhamento com agendas de Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI) podem muitas vezes subestimar a sensibilidade do perfil do cliente por focar em métricas de engajamento ou em reconhecimento na forma de prêmios da indústria ao invés do resultado”, explica Simone.   

No vídeo, Dylan não se limita a beber a cerveja personalizada em uma banheira. 

Na mesma época, acontecia o maior torneio de basquete universitário norte-americano, o March Madness, que tinha patrocínio da Bud Light. Dylan afirmava na gravação não “fazer ideia” do que era a March Madness, mas erguia um brinde à competição. As palavras foram interpretadas como ironia a um dos mais importantes torneios de um dos mais populares esportes nos EUA e com forte associação com a Bud Light.

A fala na gravação ainda reforçava uma ideia de futilidade e alienação de esportes do público feminino, de acordo com críticos. E a reação foi enorme.

A reação

Dias após a publicação do vídeo, o músico Kid Rock publicou no Twitter uma cena em que destrói frascos de Bud Light com uma rajada de metralhadora e jura nunca mais beber a cerveja. Nas redes sociais, um boicote foi convocado contra a marca e as vendas caíram de maneira de maneira drástica e consistente.

A Inbev chegou a perder 11% em valor de mercado. Mas não foi só isso. Ao optar por uma estratégia imediata de silêncio diante da reação negativa, a cervejaria acabou por desagradar aos dois lados de um tema tão polarizante.

Mais tarde, a Bud Light publicou posicionamentos em que declarava não ter tido a intenção de “dividir”. A companhia Investiu milhões de dólares no patrocínio de grandes eventos como o UFC. Ainda assim, no mesmo ano de 2023 perdeu pontos em rankings de igualdade LGBTQIA+ pela forma como lidou com a crise. Ou seja, ao procurar ficar em cima do muro, desagradou a todos.

Para o professor de marketing Rogério Tobias, a busca de um novo público deve ser feita de forma “gradual e coerente”. “É uma transição que precisa ser realizada de uma forma suave, com mensagens que preparem o consumidor para novas perspectivas e características”, diz.

Para a especialista em comunicação estratégica Tatiana Fanti, outra forma de explicar o erro neste caso de branding pode ser o misto de desconhecimento do próprio público e a ânsia de falar à maior audiência possível.

“Em comunicação, ao tentar falar com todo mundo você acaba por não falar com ninguém”, afirma a fundadora da agência Prima Donna.     

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