Esqueça a Amazônia. A nova causa dos artistas é um elefante do interior de São Paulo. Mais especificamente, Sandro, um ancião da sua espécie e uma das principais atrações do zoológico “Quinzinho de Barros”, Sorocaba (SP).
Amável, brincalhão e fã de frutas e suco de beterraba, Sandro chegou ao zoológico com 10 anos de idade, em 1972. Ele levou uma vida discreta até recentemente. Mas, nos últimos quatro anos, Sandrão (ou Gordão como também é chamado) está no centro de uma disputa judicial sobre os riscos e benefícios de sua permanência no zoológico municipal ou na transferência para um santuário no Mato Grosso.
Enquanto o futuro de Sandro é discutido na Justiça, artistas adotaram o elefante de Sorocaba como o novo protagonista da causa ambiental. Famosos como Heloísa Périssé, Xuxa, Luana Piovani, Glória Pires, Lima Duarte e Alinne Moraes questionam a decisão da prefeitura de Sorocaba de manter o elefante mesmo após a Justiça ter autorizado sua transferência.
Até a última sexta-feira, mais de 40 artistas e 22 mil anônimos assinaram uma petição, capitaneada pela atriz Bianca Bin e a Agência de Notícias de Direitos Animais (Anda), pedindo a soltura do bicho na natureza. Alguns fizeram vídeos em que repetem, com o olhar suplicante, o mote da campanha: “Liberte o Sandro”.
Por que Sandro deve ir…
Em 2022, entidades de defesa dos animais e o Ministério Público de São Paulo (MPSP) pediram a transferência de Sandro para o Santuário de Elefantes Brasil (SEB), localizado na Chapada dos Guimarães, no Mato Grosso.
A alegação desde então é que o zoológico não possui a infraestrutura adequada para mamíferos de grande porte e que ele fica isolado no parque. Sua companheira, Haisa, morreu em 2020.
Para os defensores da transferência, Sandro poderá usufruir de uma qualidade de vida e bem-estar melhores na área de 40 mil metros quadrados do santuário, onde terá ainda assistência veterinária e a companhia de outros elefantes.
Um laudo independente anexado à ação judicial mostrou que o animal sofre com dores articulares e problemas nas patas em razão do confinamento em um recinto de 2.000 m² sem árvores, lama ou estímulos, segundo a Folha de S. Paulo.
Segundo a Anda, laudos técnicos apontam que Sandro vive em “sofrimento permanente, em um ambiente sem estímulos adequados, impossibilitado de expressar comportamentos naturais essenciais à sua espécie”.
Na opinião da presidente da Anda, Silvana Andrade, a permanência dele no zoológico representa a continuidade de uma lógica ultrapassada de exploração animal: “Não existe justificativa ética ou jurídica para manter um animal confinado quando há alternativas comprovadas que lhe garantiriam bem-estar. O mínimo que a Justiça deve fazer é respeitar o direito à vida digna”.
E por que deve ficar…
Já os que são contra a sua mudança de endereço, argumentam que Sandro é animal idoso e habituado ao zoológico de Sorocaba. Passou maior parte da vida ali. A viagem de 1.400 quilômetros, somada ao período de readaptação, poderia ser estressantes e perigosa.
A prefeitura defende que a expectativa de vida na natureza é de 40 anos, enquanto em cativeiro é de 60. A diferença se deve ao acompanhamento diário, os cuidados médicos, a alimentação controlada e a falta de predadores.

A turma do “fica, Sandro” também questiona as condições do santuário e defende que o zoológico oferece bons cuidados. Segundo eles, a transferência seria uma decisão puramente ideológica, desconsiderando os riscos técnicos envolvidos.
Na mesma página da plataforma change.org onde consta o manifesto dos artistas, há outras petições para abaixo-assinado, só que pela permanência do elefante em São Paulo. Uma delas foi aberta na última quinta-feira, dia 7, e tem mais de 36 mil assinaturas até sexta-feira.
Em sua rede social, o prefeito Rodrigo Manga, que se tornou célebre por fazer vídeos humorísticos nas redes sociais, criticou a campanha encabeçada por artistas globais: “Salvaram a Amazônia, agora querem salvar o elefante de Sorocaba. Querem aparecer na internet como defensores dos animais, mas não conhecem a história, nem o Sandro e muito menos a nossa cidade”.
De acordo com ele, se for decidido que é melhor para o bicho a transferência, ele vai acatar, desde que seja com critérios técnicos: “A gente não faz política com lacre, a gente faz política com serenidade”.
Entenda o vai-e-vem na Justiça
Nos últimos quatro anos, desde que o primeiro pedido de transferência foi feito para Sandro ser levado ao santuário, a Justiça já autorizou, a prefeitura recorreu, e os dois lados apresentaram estudos para defender suas teses do melhor lar para o elefante.
Em março deste ano, a prefeitura de Sorocaba protocolou um relatório no MPSP que apontava riscos à saúde do animal no caso de uma transferência.
“Sandro é um elefante idoso que vive no Zoo há 40 anos, sob cuidados humanos, sem nunca ter vivido em uma manada, como seria no Santuário de Elefantes. Ele não possui habilidades, por exemplo, para procurar alimentos na mesma quantidade e qualidade que obtém diariamente no Zoo, há tantas décadas”, diz nota da prefeitura.
Em abril, uma decisão liminar do Juízo da Vara da Fazenda Pública da Comarca de Sorocaba concedeu a permanência do elefante no zoológico. Mas a Justiça de São Paulo emitiu uma decisão favorável à transferência de Sandro depois.
Em julho, no entanto, o desembargador Paulo Ayrosa suspendeu a autorização para a ida de Sandro ao santuário porque considerou curto o prazo de 45 dias estabelecido para o cumprimento da ordem judicial. Também, entendeu que o custo da operação era elevado, o que poderia comprometer as finanças do município.
A prefeitura de Sorocaba recorreu da sentença e o processo está em andamento.
O santuário dos elefantes
O Santuário de Elefantes Brasil (SEB) é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, que resgata elefantes cativos em situação de risco. A entidade funciona em parceria com duas organizações internacionais de defesa e estudo dos elefantes: ElephantVoices e Global Sanctuary for Elephants.
Caso Sandro se mude para lá, o elefante estará na companhia de outras sete habitantes, também oriundas de circos e zoológicos: Maia, Rana, Mara, Bambi e Guillermina (elefantas asiáticas), Pupy e Kenya (elefantas africanas).
Alguns críticos dizem que, mesmo que o nome seja bonito, o santuário é um mantenedor de animais. Eles argumentam que, apesar das boas intenções, o ambiente é uma grande área de cerrado, que pode não ser o ideal para um elefante que viveu a vida inteira em um zoológico.
Enquanto o circo midiático se forma ao redor de Sandro, o elefante boa praça de Sorocaba aguarda seu futuro no zoológico.