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Cuiaba - MT / 24 de junho de 2025 - 22:18

Anatel aproveita zona cinzenta na lei para bloquear sites

A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) aproveita uma zona cinzenta na lei do setor para pedir às provedoras de internet o bloqueio a sites suspeitos de pirataria. As decisões administrativas são muitas vezes sigilosas, sem indicar a razão para o pedido.

De acordo com o Relatório Anual de Fiscalização da agência, no ano passado foram realizadas 55 operações de bloqueio de serviços conhecidos como TV Box, que permitem o streaming de filmes e séries piratas. Nessas ações, foram desabilitados 10,8 mil endereços IP e 1.700 URLs.

“A Anatel, no âmbito da execução do Plano de Ação para Combate ao Uso de Decodificadores Clandestinos do Serviço de Acesso Condicionado, aprovado em resolução interna, pode expedir ordem de bloqueio no intuito de rotear o tráfego relacionado à prestação clandestina do SeAC (popularmente TV paga) e o uso de equipamentos não homologados”, afirma, em nota, a agência reguladora.

A agência diz que a Lei Geral de Telecomunicações “veda a conexão de dispositivos não homologados [pela Anatel] nas redes de telecomunicações”. Seria o caso dos equipamentos de TV Box.

Thiago Ayub, diretor de tecnologia da Sage Networks, discorda da justificativa usada pela Anatel para bloquear sites. “A Anatel não lida com propriedade intelectual ou audiovisual, então a saída dela foi ir contra os TV Box. Por serem ligados à rede de comunicação, eles precisariam ser licenciados pela Anatel, e eles não são”, apontou.

A partir daí, a agência reguladora começou a atuar na apreensão dos equipamentos em operações em portos, aeroportos e outros locais.

“Em dado momento, a Anatel começou a fazer um home office disso. Como é difícil ir a campo e fazer grandes apreensões, ela teve a ideia de fazer remotamente a partir do bloqueio dos sites que possibilitam o streaming ilegal”, disse. Para Ayub, a partir daí a Anatel “começou a acumular ilegalidades”.

“Primeiro, como órgão fiscalizador ela não poderia fazer isso. Segundo, não tem lei que ampare essa atuação na internet. Terceiro, elas fazem isso de maneira sigilosa. A Anatel não divulga quem escolheu bloquear, o que e a razão. Quando é no Judiciário, sabemos tudo isso”, exemplificou.

“Com discurso de combate à pirataria a agência concretamente montou serviço centralizado e automático de bloqueio de conteúdo”, afirmou. “Se alguém quiser pode usar para censura. Como não tem transparência, não tem nada, não vamos saber. Sem transparência a gente não fiscaliza.”

A Anatel afirmou que compete a ela “a adoção das medidas técnicas e administrativas necessárias e disponíveis para prevenir e cessar a atividade clandestina na prestação de serviço de televisão a cabo”. Esse ponto está estabelecido na Lei Geral de Telecomunicações.

O problema, segundo Ayub, é que a lei não rege a internet. Assim, explicou, a alegação de atuar contra a televisão a cabo pirata não deveria possibilitar o bloqueio de sites de pirataria na internet.

A própria Anatel admitiu que precisa de uma mudança legal para ter o direito de bloquear páginas na internet em audiência realizada pela CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das Bets, do Senado, no fim de 2024.

Nela, a superintendente de Fiscalização da Anatel, Gesilea Fonseca Teles, explicou que a agência é limitada a notificar as prestadoras de telecomunicações para que as empresas bloqueiem os sites ilegais.

Para mudar isso, sugeriu mudanças no Marco Civil da Internet para conceder poderes à Anatel para fiscalizar, regular e aplicar sanções.

Na prática, isso já está acontecendo, explicou Ayub. Ele apontou que a Anatel dispõe de uma ferramenta chamada Lacre Virtual que bloqueia automaticamente os sites que a própria agência julga estarem fora da lei.

“A Anatel selecionou os dez maiores provedores de internet do país e pediu a eles acesso remoto ao seus roteadores e sistemas. A partir desse acesso remoto, ela injeta os comandos de bloqueio. É um botão centralizado de censura”, afirmou.

“Outras agências reguladoras agem como fiscal. Nesse caso, a Anatel passou a ser a executora da ação. Em vez de mandar a lista de bloqueio, ela passou a executar o bloqueio”, continuou.

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Cuiaba - MT / 24 de junho de 2025 - 22:18

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