Anúncio

Cuiaba - MT / 17 de agosto de 2025 - 9:45

Historiador israelense defende Estado binacional como solução do conflito em evento em São Paulo

O historiador judeu israelense Ilan Pappe criticou o que chama de genocídio palestino e defendeu a criação de “um Estado democrático e livre para todos” na região em evento realizado na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP (Universidade de São Paulo) nesta terça-feira (5).

Em sua fala, Pappe afirmou que apenas um Estado único, com igualdade plena de direitos para palestinos e judeus, pode encerrar o ciclo de violência e segregação que marca a história da região desde 1948. “Não se trata de apagar Israel, mas de reconstruir a possibilidade de uma vida comum, do rio ao mar”, declarou.

Professor da Universidade de Exeter, no Reino Unido, e autor de 26 livros, Pappe saiu da Universidade de Haifa —cidade israelense onde nasceu e onde sua família vive— após perseguições políticas decorrentes de seu posicionamento crítico ao Estado de Israel.

A defesa de um Estado binacional como solução para o conflito entre israelenses e palestinos é popular entre setores da esquerda, mas criticada por aqueles que acreditam na necessidade da existência de um Estado próprio para judeus —um país só na região, necessariamente, não seria mais um Estado judaico.

Por essa razão, quase toda a comunidade internacional, inclusive o Brasil, apoia a solução de dois Estados —Israel e Palestina, vivendo lado a lado. Críticos dessa alternativa, por sua vez, dizem que Tel Aviv jamais permitirá a criação de um Estado palestino plenamente soberano e que, enquanto isso, trabalha para minar a possibilidade ao incentivar assentamentos judaicos na Cisjordânia.

Durante sua passagem pelo Brasil, sua participação na Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), na Flipei (Festa Literária Pirata das Editoras Independentes) e em universidades públicas, Pappe enfrentou pressões de algumas entidades pró-Israel, incluindo pedidos de cancelamento das falas e exigências de “contrapontos ideológicos”.

O diretor da FFLCH, Ádrian Pablo Fanjul, afirmou que há tentativas de importar ao Brasil o modelo de repressão a universidades adotado durante o governo de Donald Trump nos Estados Unidos.

Tanto Pappe quanto Fanjul, ambos judeus, criticaram o que chamaram de “manipulação do conceito de antissemitismo”, usada para silenciar críticas ao Estado de Israel. “Confundir antissionismo com antissemitismo é uma distorção perigosa que impede o debate necessário sobre os crimes cometidos contra o povo palestino”, afirmou o historiador israelense.

A Folha mostrou que Fanjul recebeu uma carta da organização judaica internacional Bnai Brith, que expressou “profunda preocupação” com a realização da palestra de Pappe. O texto diz que o historiador promove “discurso de ódio” e sugere que a presença de outro palestrante poderia “equilíbrio dos fatos” e termina pedindo a “reconsideração” da participação de Pappe no evento.

O texto afirma que Pappe é conhecido por discursos “agressivos, que extrapolam os limites da crítica política legítima” e alimentam o “antissemitismo contemporâneo“. Fanjul classificou a situação de “insólita”.

Durante o evento na USP, Pappe também criticou as pressões exercidas sobre universidades em todo o mundo para que evitem o uso da palavra “contexto” ao tratar do conflito na Palestina, citando especialmente o caso da Alemanha. “Dar o contexto não é um gesto revolucionário —é simplesmente o que faço como historiador. É meu trabalho e minha responsabilidade”, afirmou.

Pappe integra o grupo da “nova historiografia israelense”, grupo de historiadores que revisaram os arquivos do Estado de Israel a partir dos anos 1980, enquanto estavam abertos. Com base em documentos militares e estatais anteriormente sigilosos, ele denuncia a fundação do país sobre a expulsão de palestinos em 1948, processo que descreve como uma limpeza étnica.

Arlene Clemesha, professora de História Árabe na USP e diretora do Centro de Estudos Palestinos, mediou a fala de Pappe na FLIP e participou do evento na FFLCH. À Folha, ela destacou a relevância do autor no cenário internacional: “Ele busca romper o silenciamento, sem destilar ódio ao Estado de Israel —e sofre porque há quem não queira ouvir”.

“O mesmo ambiente que cancela e silencia Ilan Pappe o que contribui para a continuação do massacre de palestinos” acrescenta.

Facebook
Twitter
WhatsApp
Telegram
Anúncio

Cuiaba - MT / 17 de agosto de 2025 - 9:45

LEIA MAIS