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Cuiaba - MT / 1 de agosto de 2025 - 17:02

Quem foi Sergei Magnitsky, o contador que desafiou Putin e deu nome à lei usada contra Moraes

Sergei Magnitsky (1972-2009) não foi um político combativo. Tampouco um ativista barulhento, daqueles capazes de mobilizar a opinião pública na base do grito. O ucraniano que deu nome à lei americana usada para sancionar o ministro do STF Alexandre de Moraes tinha uma atividade improvável para quem viria a se tornar um símbolo da luta contra a corrupção e o autoritarismo: ele era, em essência, um contador.

Nascido em Odessa, ainda no tempo da União Soviética, Magnitsky é descrito por pessoas próximas como um auditor e advogado tributário discreto, quieto e metódico. E foi justamente esse temperamento centrado que o levou a descobrir e investigar a fundo um esquema milionário de fraude estatal, cujos envolvidos incluíam desde policiais até membros do judiciário russo. 

Após denunciar o escândalo, ele acabou na prisão, acusado de cometer os mesmos crimes que expôs. Vítima de torturas físicas e psicológicas, morreu numa cela insalubre, em uma prisão de Moscou. 

Sua saga com as autoridades russas começou em 2007, quando ele atuava no setor de auditoria de um escritório de advocacia. O principal cliente da firma era a Hermitage Capital Management, à época o maior fundo de investimento estrangeiro no país — e cujo fundador, o americano Bill Browder, já havia sido deportado da Rússia por se queixar, publicamente, das más condutas das autoridades locais.

Em junho daquele ano, oficiais do Ministério do Interior invadiram ilegalmente o escritório e confiscaram uma série de documentos. Segundo eles, uma das empresas do fundo estava sonegando impostos. 

Intrigado com a acusação, Magnitsky iniciou uma apuração própria e chegou à conclusão de que o material apreendido foi usado por uma quadrilha para assumir o controle de três subsidiárias da Hermitage — e solicitar, de forma fraudulenta, restituições de impostos que o grupo já havia pago. O reembolso, de cerca de US$ 230 milhões, ainda hoje é considerado o maior da história russa. 

A investigação do advogado implicou diretamente a polícia, o judiciário, banqueiros, mafiosos e servidores da área fiscal do governo de Vladimir Putin. Em uma atitude corajosa, ele denunciou o esquema, apresentou provas e elencou os principais nomes envolvidos (incluindo funcionários do Ministério do Interior). 

A resposta do Estado russo, no entanto, surpreendeu o contador. Em vez de apurar os crimes, a ditadura de Putin o prendeu em novembro de 2008, sob a acusação de cumplicidade em fraude e evasão fiscal. 

Morte e condenação póstuma 

Sem julgamento, Magnitsky passou 358 dias encarcerado, em seis centros de detenção diferentes. Privado de receber visitas familiares e de se alimentar adequadamente, ele rapidamente adoeceu (segundo relatórios de organizações de defesa dos direitos humanos, o advogado foi diagnosticado com cálculos biliares e pancreatite, entre outras doenças hepáticas). Há, ainda, relatos de espancamentos sistemáticos por parte de guardas das prisões.

Sergei Magnitsky morreu no dia 16 de novembro de 2009, aos 37 anos, na prisão de Matrosskaya Tishina, em Moscou. As explicações oficiais para sua morte foram contraditórias: inicialmente “ruptura da membrana abdominal”, depois “ataque cardíaco” e, finalmente, “traumatismo cranioencefálico fechado”, segundo o atestado de óbito.

A Rússia nunca puniu os responsáveis pela morte de Magnitsky. E o mais chocante: em 2013, o Estado julgou e condenou o advogado, postumamente, por sonegação fiscal. Bill Browder, seu antigo patrão, também foi sentenciado à revelia.

Browder, por sinal, tornou-se o principal articulador de uma campanha internacional por justiça no caso Magnitsky. É atribuída a ele a ideia de sancionar os envolvidos na prisão e morte do contador russo por meio do congelamento de bens e proibições de viagens aos EUA. 

Essa estratégia de punir corruptos e outros criminosos de desfrutar de sua riqueza no Ocidente acabou ganhando força no debate político americano, apoiada igualmente por republicanos e democratas. Até que, em 2012, o Congresso dos EUA aprovou a Lei Sergei Magnitsky de Responsabilidade pelo Estado de Direito, sancionada pelo presidente Barack Obama.

Desde então, a norma evoluiu e hoje é considerada uma ferramenta importante e precisa da diplomacia contemporânea — por permitir sanções contra indivíduos, em vez de punições para populações inteiras.  

Em 2017, após o Canadá aprovar uma versão local da lei, Bill Browder destacou a importância desse tipo de legislação para a causa dos direitos humanos. “Se os corruptos e criminosos, não apenas da Rússia, começarem a entender que há uma consequência para seus atos, o legado de Sergei Magnitsky terá salvado vidas. E eu terei feito algo significativo na minha vida também.”

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Cuiaba - MT / 1 de agosto de 2025 - 17:02

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