Uma recente pesquisa publicada pelo National Bureau of Economic Research (NBER), nos Estados Unidos, mostrou com uma precisão quase inédita quais os maiores impactos do divórcio na vida dos filhos dos casais separados, como aumento nos casos de gravidez na adolescência ou de mortalidade infantil e queda na renda quando adultos. Especialista ouvida pela Gazeta do Povo confirma dados apresentados na pesquisa, e aponta possíveis medidas para minimizar os efeitos nos casos em que o divórcio se torna irreversível.
No levantamento, os economistas Andrew C. Johnston, Maggie R. Jones e Nolan G. Pope utilizaram uma base de dados com registros fiscais e do Censo populacional de mais de 5 milhões de famílias com crianças nascidas entre 1988 e 1993. O resultado, apresentado em um artigo, aproxima o leitor da conclusão do quanto o divórcio em si é prejudicial, e quantifica os efeitos colaterais dessa decisão nos filhos.
A queda na renda dos adultos chega a patamares maiores do que 50%, mostra o estudo. Isso acontece porque a família, antes instalada em um único lar, agora precisa de dois imóveis separados. Essa indisponibilidade de renda exerce uma pressão financeira sobre as crianças, de modo que elas passam a contar com menos recursos disponíveis.
Os impactos, mostram os pesquisadores, são claros. Filhos de pais divorciados têm uma renda menor quando adultos, em média. Aos 25 anos de idade, alguém cujos pais se divorciaram antes dos seis anos terá aproximadamente US$ 2.500 a menos na renda anual, uma redução de até 13%, segundo o estudo. Quanto mais velha a criança for no momento do divórcio, menos negativo será o efeito. Já o divórcio precoce significa piores resultados a longo prazo.
Divórcio leva ao aumento nos casos de gravidez na adolescência
Para suprir o baque financeiro, as mães passam a trabalhar 8% a mais, enquanto para os pais essa alta chega a 16%. Os economistas apontam que décadas depois do divórcio o nível de renda pode ficar 30% abaixo do que era antes da separação, com o agravante de que em casas separadas os pais tendem a ficar mais distantes dos filhos, tanto em relação à separação física quanto ao tempo disponível para os pequenos.
“Isso atinge diretamente as crianças, não necessariamente de forma patológica, mas muitas vezes de forma situacional”, aponta a psicóloga Adriana Lot Dias. Em entrevista à Gazeta do Povo, a especialista afirma que em muitos casos os pais, em litígios, acabam colocando os filhos em uma situação de mediadores do conflito, o que é totalmente desaconselhável.
“São preocupações extras que aparecem na vida dessas crianças e desviam a atenção delas. O foco dos pequenos era direcionado para duas, três coisas, como a escola, as brincadeiras e a família. De repente aparece uma outra, enorme, com a qual elas não estão preparadas para lidar. É complicado para elas lidarem com isso”, completou.
Segundo o estudo, após a separação, há um aumento de até 60% na probabilidade de as adolescentes engravidarem. Em geral, há ainda uma elevação de aproximadamente 40% na probabilidade desses jovens serem encarcerados. Isso porque, segundo os economistas, a instabilidade familiar pode criar um ambiente propício para o envolvimento em comportamentos de maior risco social.
Estresse trazido pelo divórcio tem impactos na vida adulta dos filhos
O divórcio, explica a psicóloga, é um evento gerador de estresse em toda a família. Nas crianças, detalhou Dias, pode levar à regressão em comportamentos já superados, como medos e crises de choro. Quanto maior o tempo pelo qual essas crianças passam por momentos de crise, maiores também são os reflexos na vida adulta.
“Essa criança pode se tornar um adulto com crenças de desconfiança por ter crescido em um ambiente com muita briga, muita confusão. São regras internas que ela pode criar como a de que o casamento não é uma coisa boa, ou de que as pessoas, no fim das contas, não são confiáveis. Isso afeta todos os relacionamentos interpessoais, e não só aqueles afetivos, desse jovem adulto”, afirmou.
Pais precisam criar previsibilidade para os filhos em caso de divórcio
Para os pesquisadores, o aumento da taxa de divórcio, sobretudo entre famílias de baixa renda e menor escolaridade, é um fator que reforça o ciclo de pobreza e vulnerabilidade social. Esse fenômeno não apenas perpetua as desigualdades, como ainda interfere na formação de gerações futuras, criando um efeito cumulativo de desvantagens.
O entendimento desses mecanismos pode ajudar na criação de estratégias para reduzir esses impactos do divórcio nos mais novos. De acordo com a psicóloga, os pais precisam estimular um clima de maturidade e uma preparação, para si próprios e para os filhos, para tratar do assunto caso a separação seja inevitável.
“Os pais, independente da idade, tendem a ver os filhos como bebezinhos inertes. Esse é um ponto complicado, porque as crianças sempre percebem que alguma coisa está mudando. Então é preciso criar um mínimo de previsibilidade para os pequenos, para que eles entendam que mesmo que os pais se separem, não vão se separar dos filhos. Isso ajuda na formação da autonomia dos jovens, que será posta à prova com o passar do tempo”, concluiu.